Desde o nascimento de Mayara lutamos para o seu desenvolvimento, a dedicação das suas irmãs, do seu pai, dos parentes e dos amigos sempre foram incondicionais e com muito amor, e ela tem nos surpreendido com seus avanços, mas temos plena convicção das suas limitações.
A luta pelos seus direitos, pela sua inserção na escola, nas atividades da vida cotidiana, no trabalho, têm sido constante, mas fazer parte de uma Associação de Síndrome de Down foi necessário, pois a cada NÃO que ouvimos é na Reviver que encontramos o ombro amigo para chorar e buscar as estratégias para diminuir as barreiras atitudinais e o respeito pelas pessoas com síndrome de Down.
Mayara tem 27 anos, sempre estudou, mas ainda não consegui concluir o ensino fundamental, não por falta de incentivos, mas pelas suas próprias limitações, porém o seu esforço vem eliminando em passos muito lentos essas limitações.
As pessoas com deficiência intelectual sofrem uma grande discriminação e tem os seus direitos básicos desrespeitados, inclusive pelo Poder Público, que tem alguns dos funcionários que não sabem o que é a síndrome de Down e muitas vezes chamam de doença, numa demonstração de total ignorância, mas não buscam informação para sugerir o indeferimento de algo que foi pleiteado em seu favor.
Existem dois fatos que me marcaram muito, o primeiro porque foi negado a ela o direito de adquirir um veiculo com as isenções que a lei faculta a todas as pessoas com deficiência, pelo simples fato dela não ser curatelada, exigência que a lei não faz.
Pois bem. Na busca dessa curatela, fomos ao Poder Judiciário para pedir a interdição parcial dela, pois ela trabalha, com carteira assinada, vota, estuda, tem conta bancaria, namora, quer casar, etc. e para nossa surpresa nos deparamos com despachos do Ministério Público que se insurge para que ela seja interditada total, pois ela não podia praticar nenhum ato da vida civil. Até agora não conseguimos digerir esse entendimento.
É lógico que isso nos trouxe uma enorme decepção, pois se interditada total, como podemos lutar pela sua inserção no trabalho, como podíamos explicar para ela que não podia mais votar, como dizer para ela que não pode mais assinar os seus contratos de trabalho, que não pode mais movimentar a sua conta bancaria?
Somos testemunhas da sua alegria em poder trabalhar numa empresa como a Bosch, que abriu as suas portas para fazer inclusão, no seu quadro de funcionários, pessoas com deficiência intelectual.
Estes são pequenos exemplos, que a precisamos continuar a nossa luta para que sociedade compreenda melhor o que é a síndrome de Down e para que a inclusão se faça em todos os termos. É preciso mudança na legislação para garantir reserva de vagas no vestibular para pessoas com deficiência intelectual, para reserva de vagas em concurso público.
Dra. Marlene Dias Carvalho
Procuradora Federal Aposentada
Presidente da associação Reviver Down
Integrante do comitê Jurídico da Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down
Ativadora do Movimento Down